Nico era cantor, compositor e foi apresentador do Programa Galpão Crioulo exibido desde 1982 pela RBS TV
Morreu nesta quarta-feira, em Porto Alegre, um dos expoentes da cultura tradicionalista do Rio Grande do Sul. O historiador e folclorista Antônio Augusto Fagundes, respeitado tanto pelo trabalho como poeta quanto de estudioso da alma e das tradições gaúchas, tinha 80 anos.
Mais conhecido como Nico, nos últimos anos enfrentara uma série de problemas de saúde – um derrame, em 2000, e uma infecção que chegou a deixá-lo em coma, em 2010. O autor da célebre letra do Canto Alegretense nasceu em Alegrete em 4 de novembro de 1934 – município que homenagearia com a composição, um dos hinos da música regionalista.
Chegou a Porto Alegre aos 20 anos e rapidamente se enturmou com os fundadores do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG). Inicialmente, atuou como poeta e divulgador da obra de, entre outros, Aparício Silva Rillo e Jayme Caetano Braun.
Depois de formar-se advogado – Teixeirinha, Gildo de Freitas e outras personalidades ligadas à cultura regional foram seus clientes –, Nico se especializou em História do Rio Grande do Sul e fez Mestrado em Antropologia Social. Dedicou-se a pesquisar a formação, a identidade e os costumes típicos do Sul, levando-os a conhecimento do público por meio de livros, canções e, sobretudo, graças a sua atuação nos meios de comunicação.
Ainda na Fronteira, aos 16 anos, já trabalhava no jornal Gazeta de Alegrete, como cronista e repórter, e na Rádio Alegrete, apresentando programas humorísticos e gauchescos. Na Capital, ingressou na redação de A Hora em 1954 e, na TV Piratini, no final daquela década.
Bento Gonçalves na TV
Ampliou sua atuação para o cinema e chegou a interpretar Bento Gonçalves na minissérie global O Tempo e o Vento, exibida em 1985. Ficaria ligado para sempre como o homem à frente do programa dominical Galpão Crioulo, exibido desde 1982 pela RBS TV – e que Nico definiu, certa vez, como maior vitrina da música gauchesca.
O bordão "Gaúchos e gaúchas de todas as querências", que repetia semanalmente na televisão, tornou-se um dos mais conhecidos do gauchismo, e ajudou a tornar Nico uma das principais referências do folclore local. Com seu irmão Bagre Fagundes e com os sobrinhos Neto, Ernesto e Paulinho formou o grupo Os Fagundes, outra referência do tradicionalismo. Teve coluna semanal em Zero Hora para falar de assuntos ligados à cultura regionalista.
Entre as suas ações para além da produção artística ou jornalística, destacam-se as fundações do Conjunto de Folclore Internacional Os Gaúchos, do qual foi diretor durante 15 anos, e a Escola Gaúcha de Folclore, de nível superior, ligada ao Instituto de Tradições e Folclore, que funcionou durante seis anos.
Em 1990, criou a Cavalgada da Paz, a mais célebre e abrangente – seus roteiros são sempre internacionais – das cavalgadas promovidas pelos tradicionalistas. "Essa ação persegue o sonho de paz entre os irmãos latino-americanos", escreveu, certa vez, em seu espaço em Zero Hora, sobre o projeto.
AVC e a volta ao Galpão Crioulo
Em 2000, o folclorista sofreu um acidente vascular cerebral (AVC). Permaneceu no hospital para tratamento durante dois meses. Recuperou-se e voltou a apresentar o Galpão Crioulo na companhia de Neto Fagundes. Inquieto, seguiu freqüentando seu escritório do bairro Santana e não abria mão de atender a alguns convites de trabalho.
Foi numa dessas ocasiões, ao participar do júri oficial da 18ª e histórica edição de retomada da Tertúlia Musical Nativista, em Santa Maria, que ele manifestou os primeiros sintomas de uma septicemia (infecção generalizada).
– Ele estava muito feliz de ir à Tertúlia. Achava a volta do festival tão importante que, para poder participar, reservou três dias na véspera de uma gravação no Interior – relatou, à época, sua mulher, a funcionária pública federal Ana Piagetti Fagundes. Ana foi a terceira esposa de Nico.
Zero Hora